Mesmo com o texto do novo Código Florestal em tramitação no Congresso Nacional e sob a ameaça de ter a votação adiada para depois da Rio+20 - a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável -, em junho, e ainda que o Legislativo chegue a um consenso, o texto terá que ser revisto em cinco anos.
Com uma das maiores florestas do mundo, o Brasil vive um impasse politico há anos. O primeiro Código Florestal é de 1934, sendo reformado na década de 60. Desde então sofreu inúmeras propostas. Atualmente, uma terceira proposta segue em votação no Congresso. Entre os pontos polêmicos estão a definição do tamanho das propriedade que devem ser preservadas e a anistia a multas e penalidades dos proprietários que tenham desmatado áreas de proteção até junho de 2008. Ambientalistas rejeitam essa ideia e defendem a recuperação das áreas degradas. Os ruralistas aprovam a anistia geral. Outra questão polêmica é a proposta de recuperação de até 50% do terreno com espécies exóticas e a permissão de que a recuperação aconteça em outras áreas.
O Código que saiu do Senado é melhor - ou menos pior - que o que saiu da Câmara, que amplia as possibilidade de desmatamento legal, ao mudar por exemplo a definição de topo de morro e de mangue. A versão dos deputados também amplia áreas de interesse social e publico que poderia dar lugar a uma APP. E diminui gravemente as áreas que têm que ser recuperadas, reduzindo-as pela metade, a 25 milhões de hectares.
A solução, caso o atual projeto seja aprovado, quando o texto chegasse na mão da presidente Dilma, ela teria que exercer o veto em alguns artigos, que seriam invetáveis, por trazer pontos positivos e negativos. É possível então do ponto de vista legal, a Câmara parar o projeto no Congresso e abrir um processo para fazer todas correções necessárias e adequadas. Outra alternativa apontada é gerar um projeto adequado, aprovar na Câmara, levá-lo à Presidente, que então o vetaria e apresentaria uma medida provisória. Temos que entender o seguinte: o novo Código Florestal não é um jogo ganho, ele pode ser revertido, sim, e com calma.
É preciso votar o texto, sim, mas um texto que se aproxime do código que saiu do Senado. E é preciso provar pra sociedade que essa reforma é necessária e criar compromisso pra fazer valer tudo o que está no novo Código; e que o novo Código ficou empobrecida. Grande parte das notícias é em cima do embate político entre ruralistas e ambientalistas. Faltou incluir a sociedade, essa foi a grande perda.
A compensação de reserva legal em outros Estados, não faz sentido, a não ser que haja uma razão ecológica, de recuperar na mesma bacia ou no mesmo bioma. O Código Florestal que está em análise, claramente diminui a proteção da floresta, quando essencialmente deveria se voltar para a preservação e recuperação dessas áreas.
Temos que ter em mente que o Código Florestal brasileiro não é como um código civil que reúne todas as legislações sobre um assunto e consolida eles todos. Desde a Constituição de 88, surgiram outras leis que tratam do meio ambiente. O ideal seria que o novo Código englobasse tudo isso. A proposta atual tem uma origem muito clara de um grupo com interesses muitos específicos e motivados por resolver passivos acumulados com o tempo, que falam pelo setor rural, para fazer uma alteração que simplifique e facilite a ocupação.
Quando se iniciou o debate em 2008 da nova proposta, o principal argumento era de que o Código não tinha racionalidade técnica. Acontece que o texto atual tem muito mais inconsistências técnicas, conceituando mangue de uma forma que o mangue passa a ser quase inexistente. Todos os aspectos ligados a racionalidade foram absolutamente ignorados no atual debate, a ponto da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciências terem enviados relatórios para os parlamentares e que foram totalmente ignorados.
Não dá pra fazer uma leitura curta sobre a nova proposta, que vem sendo considerada por muitos como um lobby da bancada ruralista. Há a falta de informações precisas sobre quantos equitares de Áreas de Preservação Permanente (APP) o Brasil possui. Temos uma lei que fala em preservar, mas não sabemos o tamanho do que temos aqui. Como é possível legislar assim? A lei de crimes ambientais foi um ponto positivo por que o Brasil vinha aumentando suas taxas de desmatamento. Mas no momento em se faz valer, ela criminaliza quem já estava nas chamadas áreas consolidadas, num momento em que não havia cobrança, o que teria gerado uma reação dos agentes ruralistas. Existe um limite para a sociedade aceitar certas imposições.
No polêmico artigo 62, que determina os percentuais a serem recompostos em APPs (áreas de preservação permanente) desmatadas irregularmente em margens de rio, foram suprimidos os parágrafos do texto do Senado que estabeleciam 30m a 100 m de recuperação no caso de propriedades que margeiam rios de mais de 10m de largura. Retiraram também os gatilhos do texto do Senado que limitavam a recuperação em pequenas propriedades.
Manteve-se, porém, a exigência de recompor 15m nas margens de rios de até 10m. Os outros percentuais deverão ser regulamentados posteriormente, como queria a bancada ruralista. A regulamentação dá poder aos Estados de flexibilizar as regras. Pastagens em topos de morro e encostas também ficam liberadas, desde que não envolvam desmates futuros. A mudança acaba prejudicando os pequenos proprietários, já que o texto suprimido do Senado limitava a recomposição para propriedades de até 4 módulos fiscais (até 400 hectares).
Na questão das APPs urbanas, foram cedidas as exigências da Confederação Nacional da Indústria e foram eliminados do texto os percentuais de mata ciliar em rios urbanos. A CNI era contra o dispositivo por entender que ele implicaria em retirar instalações industriais construídas à beira de rios em todo o país.
Outras modificações feitas foram o enfraquecimento do CAR (Cadastro Ambiental Rural), mecanismo pelo qual as propriedades rurais se tornam "visíveis" à fiscalização e o artigo do texto do Senado que determina suspensão de crédito a quem não se registrar num prazo de cinco anos.
O texto também tira a prerrogativa do Ibama de autorizar desmatamentos em áreas que tenham espécies em extinção, admite a soma de APPs no cálculo reserva legal sem restrições e derruba a proibição do Senado à possibilidade de regularização de desmatamentos futuros.
O substitutivo aumenta a anistia, consolidando praticamente todas as áreas ilegalmente desmatadas até 2008, e retira força dos processos de regularização, para evitar a separação do legal/ilegal, desmatamento antigo/desmatamento novo.
O novo código representa um avanço sobre o tema e precisa ser aprovado, mas está prejudicado por questões políticas e ideológicas. Esses componentes podem expor a necessidade de ajustes. Além das regras que podem ficar comprometidas pela incapacidade de fiscalização de todo o território nacional, devido às diversas realidades produtivas que existem no país. É difícil construir uma legislação nacional para uma questão que guarda tantas especificidades.
A diversidade de biomas também causa uma dificuldade no cálculo exato e nacional do que seria o estoque de florestas suficiente para garantir uma agricultura sustentável. O georreferenciamento por satélite que está sendo elaborado pela Embrapa, mapeando a produção e os tipos de solo do território nacional, deve oferecer um cenário mais preciso para balizar políticas públicas de incentivo por parte do governo.
O governo abriu mão de votar o Código Florestal neste semestre e pediu que o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), levasse a proposta nesta quarta-feira à bancada ruralista, que a rejeitou e insiste em votar a matéria na próxima semana.
Um dos deputados presentes na reunião, Valdir Colatto (PMDB-SC), disse que a proposta do governo é continuar o debate nos próximos meses e votar somente depois da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20).
O temor do Planalto é sofrer uma derrota na votação do novo conjunto de leis ambientais, como ocorreu em maio do ano passado, quando deputados aprovaram uma emenda que ampliava os poderes dos Estados de regularizar ocupações em áreas de proteção e os tipos de atividades admitidas nessas regiões.
Adiar a votação é uma loucura. Depois de maio, junho, ninguém mais vai ao Congresso. Este é um ano eleitoral. A sociedade tem de se reunir e pressionar. Já que o Congresso deve esvaziar a partir do recesso parlamentar em julho. Por conta das eleições municipais em outubro, os parlamentares devem passar a maior parte do tempo em seus Estados e as discussões na Câmara só devem ser retomadas após o pleito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário