quinta-feira, 29 de março de 2012

E agora? Quem salvará nossos mangues?

O Código Florestal tem no aumento da vulnerabilidade dos manguezais um de seus pontos mais polêmicos. Alterações feitas abriram a possibilidade da ocupação de apicuns - uma parte dos manguezais. Pelo acordo, os produtores de camarões e de sal poderão ampliar sua atividade em até 10% na Amazônia e 35% no Nordeste.

O Brasil é o segundo país com maior cobertura de manguezais - cerca de 9% -, perdendo para a Indonésia (21%), de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). No País, eles ocorrem do Amapá até Santa Catarina. Considerados pelo atual Código Florestal como áreas de preservação permanente (APPs), os manguezais são estratégicos para a sobrevivência da população que vive no litoral e para a manutenção dos sistemas costeiros e das praias. Berçário de espécies marinhas, eles fixam carbono, protegem a linha da costa e alimentam aves migratórias e mamíferos, incluindo o homem.

Entre as pressões sofridas pelos manguezais estão a poluição por químicos e petróleo e a especulação imobiliária. No Nordeste, também são pressionados pela criação de camarão e, no Sudeste, pela ampliação portuária, como está prevista na Baixada Santista e em São Sebastião (SP). A emenda sobre os apicuns deixa o Brasil totalmente exposto. Estamos falando da costa inteira, praticamente toda coberta por manguezais, salgados e restingas. A questão não é isolada. O Brasil não tem nenhuma política pública voltada para os seus mares. O que ainda segurava a barbárie era a condição de APP dos manguezais.

Estratégicos - As áreas alagadas sempre habitaram o imaginário popular. No candomblé, a junção da água doce com a salgada é representada por Nanã - figura projetada em São Bartolomeu na Igreja Católica. Esses ecossistemas, porém, carregam uma conotação pejorativa: local de mosquitos, lama, áreas impenetráveis. Para quem vive nas grandes cidades, a imagem dos catadores de caranguejo, enterrados na lama até os joelhos, evoca um primitivismo pré-medieval. Entretanto, essas áreas são tão importantes quanto cobiçadas.

Encontradas apenas nos trópicos e subtrópicos, são regiões de interface entre a terra e o mar e, por isso, possuem água doce e salgada. Inundadas pelas marés diariamente, elas não ocorrem em áreas expostas e sim em ambientes mais fechados. Poucas espécies suportam o ambiente salobro das águas do manguezal, e as funções que esse ecossistema exerce são fundamentais para a manutenção dos serviços das regiões costeiras. Entre eles se destacam o lazer, o transporte marítimo e o fornecimento de proteína: mais de 80% das espécies marinhas se reproduzem nos manguezais.

No Brasil, a área de maior concentração contínua de manguezais está entre o Amapá e o Maranhão, incluindo praticamente toda a costa do Pará. Ainda tem extensões menores e áreas mais dependentes de cada estuário de rio, como ocorre muito no Ceará.

Expansão do porto de Santos, ocupará 7% dos mangues da Baixada - No litoral de São Paulo, os tensores das áreas de mangue diferem. No litoral norte é a especulação imobiliária e a segunda residência. Na Baixada Santista, portos, indústrias e dragagens. E o litoral sul é o mais conservado, mas vem sofrendo pressão com a perda de salinidade da água.

No Brasil, admite-se que 90% dos peixes marinhos consumidos pelo homem são provenientes de zonas costeiras e, destes, cerca de 2/3 dependem direta ou indiretamente dos estuários e mangues. Em relação a outros países, os mangues nos revelam o seguinte:
  • 90% do pescado capturado no Golfo do México rende US$ 700 milhões/ano, consistindo de espécies que são dependentes dos manguezais e demais áreas costeiras inundadas da região em algum estágio de seu ciclo vital;
  • 94% do camarão capturado no Golfo do Panamá é dependente dos estuários e manguezais da região;
  • Em Estero Real, Nicarágua, a produção anual de camarão depende de 20.000 ha de manguezais, rendendo US$ 34 milhões;
  • Relata-se um decréscimo de 20% na atividade pesqueira comercial ao longo da costa do Golfo da Flórida , após dois picos de captura em 1960 e 1965, sendo que neste mesmo período, 40% dos manguezais da baía de Tampa fora perdido em virtude da expansão de aterros com fins comerciais e residenciais.
  • Dados demonstram também a queda em 50% na captura de camarão em El Salvador desde 1964, além de outros declínios observados em populações de répteis, pássaros e mamíferos associados com a perda de 50% dos manguezais situados no país.

Diante destes dados, pode-se ter uma ideia aproximada dos extensos danos que a destruição deste ecossistema pode ocasionar não apenas à biodiversidade das zonas costeiras como das oceânicas próximas, além dos prejuízos econômicos e consequências sociais para as populações diretamente dependentes destes recursos e das atividades afins.

jornaldaciencia.org.br

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