sábado, 7 de abril de 2012

Será a Cidade dos Sonhos?


Araraquara, cidade de 200 mil habitantes no interior de São Paulo, é uma cidade diferente. Destaca-se pelas suas vias arborizadas, pelo sua alta renda média per capita, ausência de favelas e, principalmente, por ter sido uma das primeiras do Brasil a conseguir universalizar o acesso ao saneamento básico.

Lá, 100% das residências recebem água de boa qualidade, sem racionamento. Todas as casas têm coleta de esgoto. O efluente é tratado e devolvido limpo à natureza. O segredo? Desde o início do século passado, a cidade entendeu que saneamento era um serviço essencial e nunca deixou os problemas acumularem.

Getúlio Vargas Cassoli, 81 anos, nasceu e se criou em Araraquara. Uma de suas lembranças mais antigas é de ir à prefeitura, desde os 7 anos, pagar a conta d'água. "Desde sempre tivemos água encanada na casa dos meus pais. O esgoto também era canalizado. Nunca vi aqui ninguém carregando balde d'água na cabeça nem esgoto correndo a céu aberto", afirma.

O uso de reservatórios começou em 1901. A primeira obra de tratamento, com decantação e aplicação de cloro, foi inaugurada em 1948, cercada por um parque ecológico e com uma fonte pública que funciona até hoje. Quando a cidade recebeu uma grande migração de pessoas por conta da construção da linha ferroviária que passa por ali, na década de 1950, os investimentos acompanharam a necessidade.

A Vila Ferroviária, habitada pelos trabalhadores e que hoje batiza o principal time de futebol do município, foi toda construída com as ligações de água e de esgoto. Quando o governo federal instituiu sua primeira política nacional de saneamento, em 1960, Araraquara tinha suas estruturas prontas. Hoje, conta com três adutoras, 20 poços subterrâneos e uma estação que limpa os esgotos de toda a cidade.

"Sempre fizemos as obras com recursos próprios. Nunca pedimos financiamento estadual ou federal. Nossa operação sempre foi lucrativa, e todo o dinheiro ia para novas obras", afirma o engenheiro Guilherme Soares, superintendente do Departamento Autônomo de Água e Esgoto (DAAE) do município. "Trabalho aqui há 40 anos e sempre tivemos projetos para o futuro. Não se universaliza o saneamento a curto prazo" , diz Soares.

O tratamento de esgoto só virou uma prioridade no Brasil na década de 1990. Em Araraquara, o problema foi resolvido em 15 anos. Em 1993, a população começou a pagar taxa extra na conta para financiar a primeira estação.

O complexo hoje dá conta de todos os efluentes da cidade e funciona com tecnologia de ponta. O lodo que sai do esgoto é seco e queimado para facilitar a armazenagem. Até mesmo os gases que resultam da operação são lavados antes de serem jogados na atmosfera. "Aquecido a 300 ºC, o lodo fica inerte e perde 80% de seu volume, sem patogenicidade nenhuma", explica Fernando Lourencetti, gerente de projetos da DAAE.

Esse procedimento foi o único a receber financiamento externo, R$ 6 milhões do PAC. "Hoje essa preocupação ecológica é nacional, mas fomos pioneiros nesse tipo de intervenção", afirma Soares. "Mesmo com coleta completa, vimos que nossos efluentes poluíam córregos que chegavam a municípios vizinhos".

O pioneirismo da cidade é reconhecido por vários municípios vizinhos, que mandam engenheiros regularmente para conhecer os métodos utilizados em Araraquara. Um cuidado que orgulha a população. "Eu não troco isso aqui por nada. Todas as pessoas que vieram para cá em algum momento continuam aqui até hoje. É maravilhoso", diz Getúlio.

Leonardo Echeverria ANDI

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