Araraquara, cidade de 200 mil
habitantes no interior de São Paulo, é uma cidade diferente. Destaca-se pelas
suas vias arborizadas, pelo sua alta renda média per capita, ausência de
favelas e, principalmente, por ter sido uma das primeiras do Brasil a conseguir
universalizar o acesso ao saneamento básico.
Lá, 100% das residências recebem
água de boa qualidade, sem racionamento. Todas as casas têm coleta de esgoto. O
efluente é tratado e devolvido limpo à natureza. O segredo? Desde o início do
século passado, a cidade entendeu que saneamento era um serviço essencial e
nunca deixou os problemas acumularem.
Getúlio Vargas Cassoli, 81 anos,
nasceu e se criou em Araraquara. Uma de suas lembranças mais antigas é de ir à
prefeitura, desde os 7 anos, pagar a conta d'água. "Desde sempre tivemos
água encanada na casa dos meus pais. O esgoto também era canalizado. Nunca vi
aqui ninguém carregando balde d'água na cabeça nem esgoto correndo a céu
aberto", afirma.
O uso de reservatórios começou em
1901. A primeira obra de tratamento, com decantação e aplicação de cloro, foi
inaugurada em 1948, cercada por um parque ecológico e com uma fonte pública que
funciona até hoje. Quando a cidade recebeu uma grande migração de pessoas por
conta da construção da linha ferroviária que passa por ali, na década de 1950,
os investimentos acompanharam a necessidade.
A Vila Ferroviária, habitada
pelos trabalhadores e que hoje batiza o principal time de futebol do município,
foi toda construída com as ligações de água e de esgoto. Quando o governo
federal instituiu sua primeira política nacional de saneamento, em 1960,
Araraquara tinha suas estruturas prontas. Hoje, conta com três adutoras, 20 poços
subterrâneos e uma estação que limpa os esgotos de toda a cidade.
"Sempre fizemos as obras com
recursos próprios. Nunca pedimos financiamento estadual ou federal. Nossa
operação sempre foi lucrativa, e todo o dinheiro ia para novas obras",
afirma o engenheiro Guilherme Soares, superintendente do Departamento Autônomo
de Água e Esgoto (DAAE) do município. "Trabalho aqui há 40 anos e sempre
tivemos projetos para o futuro. Não se universaliza o saneamento a curto
prazo" , diz Soares.
O tratamento de esgoto só virou
uma prioridade no Brasil na década de 1990. Em Araraquara, o problema foi
resolvido em 15 anos. Em 1993, a população começou a pagar taxa extra na conta
para financiar a primeira estação.
O complexo hoje dá conta de todos
os efluentes da cidade e funciona com tecnologia de ponta. O lodo que sai do
esgoto é seco e queimado para facilitar a armazenagem. Até mesmo os gases que
resultam da operação são lavados antes de serem jogados na atmosfera.
"Aquecido a 300 ºC, o lodo fica inerte e perde 80% de seu volume, sem
patogenicidade nenhuma", explica Fernando Lourencetti, gerente de projetos
da DAAE.
Esse procedimento foi o único a
receber financiamento externo, R$ 6 milhões do PAC. "Hoje essa preocupação
ecológica é nacional, mas fomos pioneiros nesse tipo de intervenção",
afirma Soares. "Mesmo com coleta completa, vimos que nossos efluentes
poluíam córregos que chegavam a municípios vizinhos".
O pioneirismo da cidade é
reconhecido por vários municípios vizinhos, que mandam engenheiros regularmente
para conhecer os métodos utilizados em Araraquara. Um cuidado que orgulha a
população. "Eu não troco isso aqui por nada. Todas as pessoas que vieram
para cá em algum momento continuam aqui até hoje. É maravilhoso", diz
Getúlio.
Leonardo Echeverria ANDI
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