No final da década de 70, o
executivo Cláudio Pádua decidiu abandonar uma carreira de sucesso na indústria
farmacêutica, no Rio de Janeiro, estudar biologia e se dedicar à conservação
ambiental. Ele, a esposa e os filhos, chegaram a morar em uma cabana no Morro
do Diabo, no interior do Estado de São Paulo, para pesquisar o mico-leão-preto.
Anos mais tarde, ele e Suzana Pádua, sua esposa, fundaram o Instituto de
Pesquisas Ecológicas (IPE). Confira mais detalhes da história desse
ambientalista e aventureiro.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: O que
te motivou a abandonar o luxo e o conforto da cidade grande pra viver no meio
da floresta?
CLÁUDIO PÁDUA: Então, eu não
tenho uma resposta… Eu fui porque eu queria salvar a natureza, não tem uma
explicação muito lógica. Não está no campo da lógica, não está no campo da
cabeça, mas está no coração. E eu aprendi que seguir o coração da gente é uma
boa forma de levar a vida. Te dá valores, te dá consistência naquelas coisas
que você faz.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: Conte
como foi essa experiência no começo. Você chegou a se arrepender da sua
escolha?
CLÁUDIO PÁDUA: Eu saí de uma
sexta feira do escritório e disse “eu não volto mais”. E decidi nem olhar pra
trás… se eu olhasse pra trás eu podia me arrepender. E cheguei em casa, e comuniquei
a minha esposa que estava tomando essa decisão. A primeira pergunta que ela me
fez foi: “você não quer ver um psicólogo?”. E eu disse: “Não, eu estou fazendo
isso porque eu não quero ver um psicólogo”. Então, ela falou: “E que tal um
divórcio?”. Eu falei: “Não, eu também estou fazendo isso porque eu não quero um
divórcio”. E nós estamos casados a 40 anos já, então foi uma decisão certa.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: A vida
na mata muitas vezes ensina mais do que a ciência formal. Como vocês conciliam,
hoje, o conhecimento tradicional e o conhecimento científico?
CLÁUDIO PÁDUA: A vida na mata me
ensinou muitas coisas. Uma parte eu aprendi com a própria natureza, tem coisas
pra aprender com a natureza todos os dias… Eu trabalhei com macacos, e aprendi
muito com as famílias dos primatas: como eles convivem, como os pais tratam os
filhos e como os irmãos se tratam, e a relação deles com os recursos naturais
que a mata lhes dá. Mas também aprendi muito com um auxiliar de campo, Seu
José, uma dessas pessoas que não teve a chance de estudar, como muitas no
Brasil, mas que traz em si o conhecimento da natureza, um conhecimento de um
sábio, um verdadeiro sábio.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: Você
tem uma frase que é muito forte: se os ambientalistas se preocuparem apenas com
a preservação dos animais, eles irão desaparecer da face da Terra. É preciso
trabalhar com gente. O que significa trabalhar com gente para conservação
ambiental?
CLÁUDIO PÁDUA: Isso eu aprendi
logo no começo quando fui morar lá [no Morro do Diabo]. Porque eu achava, nesse
momento, que se eu estudasse muito da biologia das árvores, das plantas, dos
animais, eu ia conseguir salvá-los, eu ia conseguir fazer a conservação… Mas,
em pouco tempo, eu descobri que tem gente envolvida no processo, tem ser humano,
tem relações, tem ecossistemas. E nós partimos para um trabalho de educação
ambiental, um trabalho de melhoria da qualidade de vida daquelas populações,
transformando-as em aliados no processo de conservação. Não era mais algo como
“você não chegue aqui, porque eu preciso proteger esse local”, mas era “vamos
juntos e ver como podemos fazer pra ter conservação e ter melhoria na sua
vida”.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: Atualmente,
muita gente tem feito uma escolha parecida com a sua de abandonar a vida na
cidade e procurar se reconectar com a natureza. Por que você acha que isso tem
acontecido?
CLÁUDIO PÁDUA: Primeiro porque a
população está ficando muito urbana, mas as pessoas às vezes se esquecem de que
elas também fazem parte do mundo natural. E, de vez em quando, vem uma
oportunidade para um ou para outro de relembrar esse conhecimento de que faz
parte do mundo natural, e tentar se reconectar com a natureza. Então, eu acho
que fica faltando alguma coisa na formação daquela pessoa que não tem essa oportunidade.
Porque essa reconexão com a energia, essa energia vital, é extraordinária para
a formação de uma pessoa, para a formação de um caráter, para a formação do
intelecto.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: Talvez,
agora, a gente tenha um novo desafio de buscar essa reconexão com o meio
ambiente mesmo escolhendo viver em uma cidade. Como podemos adquirir essa
consciência de que somos apenas mais uma espécie nessa grande cadeia da vida?
CLÁUDIO PÁDUA: Primeiro, a cidade
precisa mudar, pra falar a verdade. Mas, ainda assim, qualquer um tem a
oportunidade de, em uma cidade, achar o seu nicho, seu pedacinho de natureza na
vida da cidade. Seja num parque, seja caminhando na beira de um córrego, ou
seja achando seu espaço, mesmo dentro do seu apartamento, cuidando das suas
plantinhas, criando um vínculo, uma conexão dentro daquele espaço que a selva
de pedra te permite.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: Se
você pudesse escolher apenas uma coisa que cada indivíduo deveria fazer para se
tornar um amigo do meio ambiente, por onde a gente poderia começar?
CLÁUDIO PÁDUA: Eu acho que as
pessoas têm que começar compreendendo que nós somos um grãozinho de areia,
nosso planeta é um grãozinho de areia num universo muito maior. E que esse
grãozinho de areia teve uma oportunidade, não se sabe por que, de ter vida. E
valorizar a vida, tentando preservar todos os tipos de vida que estão aqui,
sejam eles da sua maior diversidade possível. Se você tiver essa compreensão,
esse conhecimento, já é um grande passo.
FLORESTA DO MEIO DO MUNDO: E
hoje, quando você olha para essas mais de três décadas depois de ter feito a
sua escolha de seguir seu coração, você teria feito alguma coisa diferente?
Valeu a pena ter a natureza como causa e paixão da sua vida?
CLÁUDIO PÁDUA: Honestamente, eu
não poderia estar mais feliz. Fiz aquilo que meu coração mandou. Se você
consegue trabalhar pela sua missão, consegue atingir sua missão, ou mesmo que
não consiga, mas está trabalhando por ela, porque é uma construção na sua vida;
se você puder aliar essa construção de uma missão para o bem, e uma missão em
que você pode incorporar a família, que mais eu posso esperar? Felicidade
completa!
NaturaEkos
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