8 fatores explicam o preço
mais alto dos alimentos sem agrotóxicos. E nada explica o conformismo diante do
alto custo ambiental, social e de saúde pública que vem de brinde com a
agricultura baseada em aditivos químicos. Ninguém, em sã consciência, prefere
comida com agrotóxico, mas os orgânicos no Brasil ainda são bem mais caros, o
que deixa muita gente inconformada.
1 – Eles demoram mais para amadurecer
A agricultura orgânica consegue
nível semelhante de produção por metro quadrado à da lavoura que usa adubos
artificiais e agrotóxicos. No entanto, os alimentos se desenvolvem mais
devagar. A cenoura orgânica, por exemplo, é colhida por volta de 116 dias após
a semeadura enquanto a versão com aditivos químicos fica pronta em 97 dias. Ou
seja, a safra ocupa a terra por mais tempo. E tempo é dinheiro.
Por outro lado, essa desvantagem
comercial torna os orgânicos mais nutritivos e saborosos, pois vão extraindo da
terra nutrientes mais variados e em maior quantidade. Enquanto os vegetais
cultivados à base de compostos químicos sintéticos recebem basicamente apenas
três macronutrientes -nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K) - os
adubos orgânicos oferecem toda uma tabela periódica em sua lista de
ingredientes.
2 – Certificação
Por incrível que pareça, não há
fiscalização obrigatória nas lavouras que usam agrotóxicos. Os abusos,
ultrafrequentes, são descobertos pela ANVISA (Agência de Vigilância Sanitária)
apenas ao recolher amostras de alimentos em supermercados. Para sentir o drama,
é só clicar nesse link: http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,pimentao-e-o-campeao-do-agrotoxico-mostra-estudo-da-anvisa,355203,0.htm.
Já o produto orgânico precisa ser
certificado. Ou seja, o produtor deve arcar com a auditoria anual de sua
propriedade, o que custa em média cerca de R$ 3 mil. Existem outras formas de
certificação por meio de cooperativas que, embora sem custo fixo, demandam
bastante tempo e dedicação, desviando o agricultor de sua função principal.
3 – Período de conversão
Um agricultor convencional que
resolve virar orgânico passará por um tempo de vacas magras, pois sua terra
está “viciada” em produtos químicos e não é fácil recompor a fertilidade
utilizando recursos naturais. Durante essa fase, não há nenhum tipo de
financiamento governamental que permita ao produtor sobreviver até conseguir
safras melhores. No campo, essa talvez seja a principal barreira à adoção do
sistema orgânico. Ou seja, existe muita gente querendo sair do esquema
convencional, mas não consegue por razões financeiras de curto prazo.
4 – Falta de crédito
No Brasil não existem linhas de
financiamento voltadas para a agroecologia. Parece mentira, mas para conseguir
liberação de dinheiro no banco, o produtor precisa mostrar a nota fiscal
comprovando que adquiriu agrotóxicos. Veja com seus próprios olhos o depoimento
deles no documentário “O Veneno está na Mesa”, de Silvio Tendler, e aproveite
para ampliar seus conhecimentos sobre o tema. O filme está totalmente livre
para cópia e veiculação: http://www.youtube.com/watch?v=8RVAgD44AGg.
5 - Barreira de isolamento
De acordo com a legislação atual,
quem usa substâncias potencialmente tóxicas na lavoura não precisa se preocupar
com os resíduos que deixa na atmosfera, na água e no solo, além de estar isento
de responsabilidade caso seja comprovada a contaminação de um trabalhador. Para
completar, nada o impede de borrifar agrotóxicos até o limite de sua
propriedade, mesmo sabendo que a pulverização invadirá o território alheio.
Já o produtor orgânico precisa
manter uma faixa de vegetação robusta e alta para isolar seu cultivo da química
dos vizinhos. Ou seja, uma parte de sua propriedade não pode ser utilizada para
plantar alimentos, o que reduz a produtividade.
6 - Menor escala de produção
O agronegócio convencional
privilegia a monocultura. Assim, terrenos imensos são ocupados por uma única
espécie (algo muito atraente para pragas e doenças, pois, quando o invasor
encontra esse farto banquete, se dissemina em altíssima velocidade). No sistema
orgânico dá-se preferência ao plantio conjunto de várias espécies vegetais e ao
consórcio com a criação animal. Desse modo, é mais rica a produção interna de
adubo (feito com esterco e sobras vegetais) e mais eficiente o controle das
espécies indesejáveis.
No entanto, uma propriedade com
vários cultivos emprega maior número de trabalhadores e há menor possibilidade
de mecanização. Outro complicador do ponto de vista comercial é que, ao ter
quantidades pequenas de diferentes produtos para oferecer ao mercado, o
produtor orgânico perde poder de barganha.
Um detalhe, porém, não deve ser
esquecido: do ponto de vista socioambiental, essas aparentes desvantagens são
muito positivas.
7 – Ganância dos
supermercados
Grandes varejistas investem
bastante em pesquisas sobre hábitos de consumo e logo descobriram que as
pessoas com maior poder aquisitivo e nível de instrução são as que mais
consomem orgânicos. Encontraram aí uma excelente oportunidade de inflar preços
e foi o que fizeram. Uma pesquisa do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor)
realizada em 2010 flagrou uma diferença de preços de até 463% num mesmo produto
orgânico (http://www.idec.org.br/em-acao/revista/142/materia/quer-pagar-quanto).
Para quem busca alimentos sem veneno por preço em conta, as feiras de orgânicos
são a melhor alternativa (procure aqui: http://www.slowfoodbrasil.com/textos/noticias-slow-food/504-voce-conhece-as-feiras-organicas-da-sua-cidade),
seguidas pelos esquemas delivery (para saber mais sobre essa opção: http://conectarcomunicacao.com.br/blog/98-diga-adeus-aos-agrotxicos/.).
8 – Falta de assistência
técnica e pesquisa
Antigamente existiam no país as
redes de assistência rural financiadas pelo governo. Aos poucos, o poder
público foi abandonando essa importante função e deixou o espaço livre para os
fabricantes e revendedores de adubos sintéticos e agrotóxicos. Assim, quem dá
orientações técnicas aos agricultores hoje em dia são os vendedores dessas
fórmulas. Claro que eles não têm interesse nenhum em ajudar quem não consome
seus produtos. Além disso, nas faculdades de agronomia predomina o ensino da
agricultura baseada em insumos químicos, gerando carência de profissionais que
sabem cultivar a terra sem apelar para eles. Para complicar de vez a situação
da agroecologia, entidades como a FAPESP, o CNPQ e a CAPES não costumam liberar
bolsas de estudos para quem se propõe a estudar agricultura orgânica e
familiar.
Com tudo isso, dá para ver
que os alimentos convencionais, aparentemente mais baratos, na verdade saem
muito caro. Em seu preço não estão computados:
- O custo social representado pelo abandono do campo e inchaço das periferias urbanas;
- O custo em termos de saúde pública que tem origem no enorme número de pessoas intoxicadas pelos agrotóxicos, seja de forma aguda ou crônica (câncer, doenças neurológicas e endócrinas entre outras);
- O custo ambiental devido à contaminação química do ar, da água e do solo, à perda da fertilidade do solo e da biodiversidade.
Do dia para a noite não haverá
solução mágica para levar orgânicos baratos à mesa de todos os brasileiros. Mas
já existem esquemas alternativos e mais acessíveis para adquiri-los (veja acima
o exemplo do delivery e das feiras orgânicas) e outros virão por aí.
A gente pode e deve brigar para
virar esse jogo. Temos o direito de exigir que o dinheiro público seja
investido num modelo agrícola mais justo e sustentável, em vez de virar
subsídio para os agrotóxicos, que, aliás, têm isenção de impostos!
Claudia Visoni é jornalista,
paulistana e dirige a empresa Conectar Comunicação (www.conectar.com.br).
Desde a adolescência, pesquisa assuntos ligados à ecologia e ao consumo,
buscando alternativas para viver bem economizando os recursos naturais. E-mail:
claudia@conectar.com.br
Artigo enviado pela Autora e
originalmente publicado em seu blogue pessoal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário