segunda-feira, 25 de junho de 2012

Geofagia: o ato de comer terra


Novas descobertas sugerem que comer terra não é necessariamente patológico, mas apenas uma adaptação. Estão servidos?

Em 2009, um grupo de estudantes de biologia da Tufts University reuniu-se para comer terra. Eles moeram pequenos torrões de argila e ingeriram o pó para descobrir, pela primeira vez, o sabor desse material. Esse estranho teste de sabor era parte de um curso de medicina darwiniana oferecido por um de nós (Starks). Os alunos estavam estudando a evolução da geofagia – a prática de comer terra, principalmente solos semelhantes à argila, coisa que animais e pessoas praticam há milênios.

O guia padrão de referência para psiquiatras – a quarta edição do Manual de Estatística e Diagnóstico de Transtornos Mentais (DSMI, na sigla em inglês) – classifica a geofagia como um transtorno de alimentação em que a pessoa consome coisas que não são alimentos, como cinza de cigarro e tinta de parede. Mas como os alunos viriam a descobrir, estudos culturais de animais e humanos sugerem que a geofagia não é necessariamente uma anormalidade – na verdade, ela é um tipo de adaptação. Os pesquisadores estão analisando o ato de comer terra sob um ângulo diferente e descobrindo que o comportamento geralmente serve para suprir minerais vitais e para desativar toxinas de alimentos e do ambiente.

Abordagem evolucionária

Uma forma de decidir se a geofagia é anormal ou adaptativa é determinar até que ponto o comportamento é comum em animais e em sociedades humanas. Como o comportamento é observado em muitas espécies e culturas diferentes, é provável que seja benéfico.

Atualmente parece não haver dúvida de que a geofagia é ainda mais comum no reino animal do que se pensava. Os pesquisadores observaram geofagia em mais de 200 espécies de animais, incluindo papagaios, veados, elefantes, morcegos, coelhos, babuínos, gorilas e chimpanzés. A geofagia também é bem documentada em humanos, com registros que datam da época de Hipócrates (460 a.C.). Os mesopotâmios e antigos egípcios usavam a argila medicinalmente: eles cobriam ferimentos com emplastros de barro e comiam terra para tratar de várias doenças, principalmente do intestino. Alguns povos indígenas das Américas usavam terra como um tempero e preparavam alimentos naturalmente amargos como noz de carvalho e batatas com um pouco de terra para neutralizar o amargor. A geofagia foi praticada com frequência na Europa até o século 19 e em algumas sociedades, como a etnia Tiv, da Nigéria, o desejo de comer terra é sinal de gravidez.

Uma explicação comum para o hábito de animais e pessoas ingerirem terra é que o solo contém minerais como cálcio, sódio e ferro, que mantêm a produção de energia e outros processos biológicos vitais. Como as necessidades desses minerais variam com a estação do ano, com a idade e com o estado geral de saúde dos animais, a geofagia é particularmente comum quando sua dieta alimentar não fornece minerais suficientes ou quando os desafios do ambiente exigem mais energia que o normal. Gorilas-das-montanhas e búfalos africanos que vivem em altas altitudes podem, por exemplo, ingerir terra como uma fonte de ferro que promove o desenvolvimento das células vermelhas do sangue. Elefantes, gorilas e morcegos consomem terra rica em sódio quando sua alimentação não contém quantidades suficientes desse elemento químico. Populações de elefantes visitam constantemente cavernas subterrâneas onde cavam e ingerem rochas ricas em sal.

Scientific American Brasil

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