Na Semana Santa, a celebração da
morte e ressurreição de Jesus divide o espaço com o boom do comércio e consumo
de carne de peixes. O feriadão em questão, em especial a Sexta-Feira Santa, é a
época em que mais se comercializa e se consome esse tipo de carne no ano. As
feiras, peixarias e supermercados de todo o Brasil lotam-se com milhões e
milhões de peixes e uma multidão os compra para comê-los. A sociedade curte
muito e a mídia incentiva, mas, aos olhos da natureza e da ética do respeito à
vida animal, tais comportamentos se fazem perigosos e condenáveis.
A imprensa que fomenta a morte
dos peixes
A imprensa, alienando a população
de todos os problemas éticos e ambientais causados pela pesca, mostra com
satisfação a prosperidade temporária dos vendedores de peixe (morto), ignorando
e/ou omitindo completamente que é essa mesma fartura que vem causando um
dramático declínio na população de grande parte das espécies “pescáveis”, se
não todas, em todos os mares e oceanos do planeta.
As notícias sobre queda e extinção
local de muitas espécies de peixes multiplicam-se, mas, de forma quase irônica,
as relacionadas ao comércio e consumo de “pescado”, sempre acríticas, ganham
destaque, muitas vezes nos mesmíssimos jornais, telejornais ou sites, durante o
feriado cristão. Notas sobre preço, disponibilidade e demanda e receitas
culinárias imperam nos dias anteriores à Sexta-Feira Santa, dia em que a carne
vermelha é vedada da mesa dos cristãos – por motivos meramente religiosos, nada
relacionados com ética, compaixão ou não-violência.
E os fatos de que os peixes
agonizam muito em asfixia depois de retirados da água e poderiam ter suas vidas
poupadas e respeitadas graças à existência do vegetarianismo simplesmente
inexistem perante o olhar dessa mídia.
A crise ambiental que a Sexta
Santa ajuda a piorar
Com todo esse estímulo da TV, dos
jornais e dos portais online e embalado pela tradição, o povo se esbalda com a
carne aquática no feriado. Ignora-se completamente que o costume cristão vem
ajudando muito, para não dizer fundamentalmente, para a já citada crise
populacional dos peixes nas vastas águas da Terra. Para se ter uma ideia dessa
que se mostra como uma calamidade ecológica, alguns dados:
- A
pesca em grande escala está ameaçando nada menos que 75% da população de peixes
do mundo, segundo estudo da WWF de 2008;
-
Na faixa territorial oceânica brasileira, 80% das espécies mais procuradas por
pescadores estão ameaçadas de extinção por causa da sobrepesca e da pesca por
redes de arrasto;
-
80% dos bancos de pesca mundiais estão em declínio ou esgotados;
-
A pesca hoje está num ritmo duas a três vezes superior à capacidade de
regeneração das populações aquáticas das águas do planeta. Em tal ritmo, todas
as espécies “pescáveis” terão desaparecido em 2050;
-
A população de peixes está diminuindo consideravelmente em diversos locais do
mundo onde é pescada. A população de atum-azul diminuiu 10% em relação a meados
do século 20 no Oceano Atlântico e no Mar Mediterrâneo. Na costa da
Escandinávia, já foi extinta. Nas fazendas de aquicultura da Europa, caiu 25%
em apenas um ano;
-
Pesca e pecuária estão interligadas: rações preparadas a partir de peixes
representam 37% do total de peixes retirados anualmente dos oceanos; 90% dessa
porcentagem são trans-formados em óleo e farinha de peixe. Dessa farinha e
óleo, 46% são utilizados como alimento na aquicultura de peixes e outros 46%
são destinados para ração da pecuária suína e aviária;
- Das 30
espécies de tubarões pelágicos, que vivem em alto-mar, 11 correm em risco de
extinção por causa da pesca que captura ora tubarões inteiros, ora suas
barbatanas (nesse caso os tubarões são abandonados à morte depois de mutilados);
-
A pesca profunda com redes de arrasto é capaz de levar embora, junto com os
animais “pescáveis”, até 4 toneladas de corais, o que vem contribuindo para a
ameaça mundial que os recifes de coral estão sofrendo.
Sofrimento dos peixes e ética
Também merece ser considerado o
sofrimento desses animais quando são içados da água. Basta ver a força e o
frenesi com que o peixe se debate depois de capturado, mais o movimento de sua
boca quando já perdeu suas forças. Sua agonia é algo escancarado, visível a
todos, mas é tratada com muita naturalidade e insensibilidade pelo pescador e
totalmente ignorada por quem come esses bichos.
Mas felizmente há como evitar
causar esse sofrimento intenso: a existência do vegetarianismo, com sua cada
vez mais comprovada sustentabilidade nutricional, torna o consumo de carne de
peixe totalmente dispensável e nos permite respeitar o direito à vida dos
peixes e evitar que eles sofram em nossas mãos. Aliás, todos os animais, como
seres sencientes (exceto poríferos), têm o direito à vida e ao respeito ao seu
consciente interesse de viver, e sua morte para consumo alimentar pode ser
evitada com a adoção da alimentação vegetariana.
Mas tudo isso não é nada perante
a imprensa e a sociedade, que desconhecem esses direitos e a capacidade dos
peixes de sofrer e continuam cegamente comendo suas carnes. Promovem, sem
nenhuma preocupação, a agonia tanto senciente quanto ecológica desses bichos. O
vegetarianismo não é reconhecido pelos veículos de comunicação nem pela maioria
dos cristãos como meio de se fazer uma Semana Santa iluminada pelo respeito e
compaixão à vida – pelo contrário, levam adiante a crença tácita de que esses
animais não são dignos de ter suas vidas preservadas e recusam-se a incluí-los
em sua ética de respeito ao outro. Aliás, no feriadão o vegetarianismo e os
pratos livres de animais praticamente deixam de existir na mídia.
Consideração final
A alienação ambiental, a ética
seletiva e o desamor perante formas sensíveis de vida são velhos costumes na
semana santificada por uma religião que ironicamente prega a caridade e o amor
ao próximo. Nesta época são praxe os pecados contra a vida e a natureza. E a
cristandade, apoiada pela tradição e pela comunicação de massa, caminha
tornando a biosfera cada vez mais desequilibrada e escassa de fauna e causando
sofrimento e morte despreocupadamente a bilhões de animais. Enfim, tornando o
mundo pior.
A você que leu este texto, desejo
boa Semana Santa e que pense na vida dos peixes.
Texto extraído do site http://consciencia.blog.br
- Por Robson Fernando de Souza.