Novas descobertas sugerem que
comer terra não é necessariamente patológico, mas apenas uma adaptação. Estão servidos?
Em 2009, um grupo de estudantes de
biologia da Tufts University reuniu-se para comer terra. Eles moeram pequenos
torrões de argila e ingeriram o pó para descobrir, pela primeira vez, o sabor
desse material. Esse estranho teste de sabor era parte de um curso de medicina
darwiniana oferecido por um de nós (Starks). Os alunos estavam estudando a
evolução da geofagia – a prática de comer terra, principalmente solos
semelhantes à argila, coisa que animais e pessoas praticam há milênios.
O guia padrão de referência para
psiquiatras – a quarta edição do Manual de Estatística e Diagnóstico de
Transtornos Mentais (DSMI, na sigla em inglês) – classifica a
geofagia como um transtorno de alimentação em que a pessoa consome coisas que
não são alimentos, como cinza de cigarro e tinta de parede. Mas como os
alunos viriam a descobrir, estudos culturais de animais e humanos sugerem que a
geofagia não é necessariamente uma anormalidade – na verdade, ela é um tipo de
adaptação. Os pesquisadores estão analisando o ato de comer terra sob um ângulo
diferente e descobrindo que o comportamento geralmente serve para suprir
minerais vitais e para desativar toxinas de alimentos e do ambiente.
Abordagem evolucionária
Uma forma de decidir se a
geofagia é anormal ou adaptativa é determinar até que ponto o comportamento é
comum em animais e em sociedades humanas. Como o comportamento é observado em
muitas espécies e culturas diferentes, é provável que seja benéfico.
Atualmente parece não haver
dúvida de que a geofagia é ainda mais comum no reino animal do que se pensava.
Os pesquisadores observaram geofagia em mais de 200 espécies de animais,
incluindo papagaios, veados, elefantes, morcegos, coelhos, babuínos, gorilas e
chimpanzés. A geofagia também é bem documentada em humanos, com registros que
datam da época de Hipócrates (460 a.C.). Os mesopotâmios e antigos egípcios
usavam a argila medicinalmente: eles cobriam ferimentos com emplastros de barro
e comiam terra para tratar de várias doenças, principalmente do intestino.
Alguns povos indígenas das Américas usavam terra como um tempero e preparavam
alimentos naturalmente amargos como noz de carvalho e batatas com um pouco de
terra para neutralizar o amargor. A geofagia foi praticada com frequência na
Europa até o século 19 e em algumas sociedades, como a etnia Tiv, da Nigéria, o
desejo de comer terra é sinal de gravidez.
Uma explicação comum para o
hábito de animais e pessoas ingerirem terra é que o solo contém minerais como
cálcio, sódio e ferro, que mantêm a produção de energia e outros processos
biológicos vitais. Como as necessidades desses minerais variam com a estação do
ano, com a idade e com o estado geral de saúde dos animais, a geofagia é
particularmente comum quando sua dieta alimentar não fornece minerais
suficientes ou quando os desafios do ambiente exigem mais energia que o normal.
Gorilas-das-montanhas e búfalos africanos que vivem em altas altitudes podem,
por exemplo, ingerir terra como uma fonte de ferro que promove o
desenvolvimento das células vermelhas do sangue. Elefantes, gorilas e morcegos
consomem terra rica em sódio quando sua alimentação não contém quantidades
suficientes desse elemento químico. Populações de elefantes visitam
constantemente cavernas subterrâneas onde cavam e ingerem rochas ricas em sal.
Scientific American Brasil
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